Brilho Dourado [final]

flor dourada

*pra quem perdeu o começo da história, tá aqui.

CONTINUAÇÃO

Tudo fora abalado. Tudo o que conheciam, tudo no que se apoiavam, toda sua história. Foi uma grande destruição e os sobreviventes sentiam-se perdidos. A única coisa que restou foi a bela planta dourada, que agora parecia apenas uma, ramificada em milhares de flores reluzentes. Sentiram fome, não havia o que comer. Tentaram comer a flor dourada e amargamente descobriram ser imprópria e mortalmente venenosa. Sentiram frio, não havia madeira. Tentaram fazer fogueiras com a planta, porém a mesma demorava para queimar e suas cinzas irritavam os olhos. Tiveram sede, entretanto, as fontes que ainda não tinham secado por causa da espécie intrusa, estavam contaminadas com a grande quantidade de detritos e mortos. Tinham apenas uns aos outros e a companhia implacável e dourada da planta.  

Em pouco tempo, a busca por culpados começou. Dedos apontados e vozes exaltadas cruzavam o ar. E daqueles a quem lançavam a culpa nem se sabia o paradeiro. Especularam fuga. Especularam esconderijos. Especularam morte. Apenas a inocência não foi citada. Um início de tumulto iniciou-se. Até que um padeiro se prontificou a caminhar até a cidade mais próxima para buscar ajuda, pois, todos estavam fracos e alguns feridos. Era um plano arriscado, mas, não havia muito a ser feito. Resolvido isso, foram dormir. 

A noite estava desoladamente calma. Silenciosa. Dormiram todos juntos para tentar se aquecer. Com o amanhecer, aqueles que restaram foram acordados pelo já tradicional brilho dourado do sol refletido em centenas de flores igualmente douradas e acompanhado por um cheiro terrível, porém já conhecido: o odor medonho da planta dourada. Só que dessa vez, o fedor estava tão forte que parecia ser quase palpável. Deu dor de cabeça em alguns. Era como se estivesse multiplicado a um milhão.  

Em pequenos grupos, partiram pelos escombros para procurar comida, tampando seus narizes da melhor forma que podiam. E, milagrosamente, já não havia mais nenhum corpo, seja humano ou de animal. Em parte alguma. Duvidaram da própria sanidade. A discussão recomeçou. Novamente houve quem acusasse a planta e dessa vez, o coro era maior. Certas pessoas, mesmo feridas e com medo, decidiram se arriscar como o padeiro e fugiram apenas com a roupa do corpo. Um grupo decidiu ficar e aguardar um resgate, pois temia a jornada pelos campos que poderiam estar infestados de predadores, devido à oferta de carne (afinal, não acreditavam que os corpos haviam sumido, mas, que foram arrastados para fora da cidade por animais selvagens). Por fim, aqueles que não conseguiam se decidir e acabaram ficando também. 

Os dias se passaram douradamente iguais. Não havia o que comer e lentamente os que sobraram foram morrendo em consequência de seus ferimentos, da fome e da sede. O resgate nunca chegou. Apenas o mar dourado permanecia forte e intocado. Crescendo mais lentamente, porém, robusto. Até que o último, já sem forças para levantar e fugir, entregou-se à sua (falta de) sorte. Com o passar dos anos, a floresta se fechou em volta da cidade abandonada, cercando o maravilhoso campo de flores douradas. 

Mais tarde, esta história ficou conhecida e botânicos resolveram se aventurar naquele local, pois tudo virou uma grande lenda e queriam investigar. Não havia mais vestígios da pulsante cidade que outrora estava ali. Havia apenas aquele incomparável brilho dourado. Esta planta era chamada de “sorte”, de “riqueza” e de “fortuna”. Seu verdadeiro nome é “dinheiro”, consequentemente, de onde veio todos os males.

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