Segue abaixo uma proposta absurda de um estilo de vida e de governância que só podia ter vindo de um louco, alguém que não tem nada na cabeça e deve estar disposto a perder tudo o que tem.
Esse texto foi encontrado na Bacia das Almas, blog de Paulo Brabo, que inclusive traz alguns comentários do contexto e algumas ressonância do texto na história. Outros loucos optaram por essa mesma loucura.
De antemão reafirmo, esse texto é insano e sem noção, algo que só uma mente desapegada e completamente pirada no evangelho é capaz de fazer. Saboreie com cuidado!
DECLARAÇÃO DAS POSTURAS ADOTADAS PELA CONVENÇÃO DE PAZ da Society for the Establishment of Peace among Men (Sociedade para a promoção da paz entre os homens):
Nós abaixo assinados consideramos como nosso dever a nós mesmos, à causa que amamos, ao país em que vivemos, publicar uma declaração que expresse os propósitos que ansiamos alcançar e as medidas que adotaremos para levar adiante a obra da reforma pacífica universal.
Não reconhecemos submissão a qualquer governo humano. Reconhecemos apenas um Rei e Legislador, um Juiz e Governante da humanidade. Nosso país é o mundo, nossos compatriotas a humanidade. Amamos a nossa terra natal apenas na medida em que amamos todas as outras terras. Os interesses e direitos dos cidadãos norte-americanos não nos são mais caros do que os da raça humana como um todo, diante do que não podemos permitir qualquer apelo ao patriotismo a fim de vingar qualquer ofensa ou injúria nacional.
Entendemos que uma nação não tem qualquer direito de se defender contra inimigos externos ou de punir invasores, que nenhum indivíduo possui de si mesmo esse direito, e que o indivíduo não pode ter maior precedência que o agregado. Se uma multidão de soldados estrangeiros que tencionem cometer pilhagem e destruir vidas não deve ser resistido pelo povo ou pela magistratura, tampouco resistência deve ser oferecida diante dos perturbadores domésticos da paz pública e da segurança privada.
O dogma de que todos os governos do mundo são ordenados com a aprovação de Deus, e que os poderes constituídos nos Estados Unidos, na Rússia e na Turquia agem em conformidade com a sua vontade, é tão absurdo quanto ímpio. Ele torna desigual e tirânico o Autor imparcial da nossa existência. Não se pode afirmar que os poderes constituídos de qualquer nação sejam impelidos ou guiados pelo exemplo de Cristo no tratamento dos inimigos; eles não podem estar portanto de acordo com a vontade de Deus, e portanto a derrubada desses regimes através de uma regeneração espiritual dos seus cidadãos é inevitável.
Tomamos por anticristãs e ilegítimas não apenas todas as guerras, quer ofensivas, quer defensivas, mas todas as preparações para a guerra; toda nave de guerra, todo arsenal, toda fortificação tomamos por anticristã e ilegítima; a existência de qualquer exército constituído, todos os chefes militares, todos os monumentos que comemoram a vitória sobre um inimigo caído, todos os troféus de guerra, todas as celebrações em honra de façanhas militares, todas os confiscos realizados para defesa armada; consideramos anticristão e ilegítimo qualquer edito governamental que requeira dos seus cidadãos o serviço militar.
Como julgamos ilegítimo o porte de armas, não podemos assumir qualquer posição que exija do seu responsável que procure coagir os homens a fazer o que é certo sob a ameaça de dor ou de prisão ou de morte. Nós portanto nos excluímos voluntariamente de todo corpo legislativo e judicial e repudiamos toda política humana, honras mundanas e posições de autoridade. Se não podemos ocupar um assento na câmara legislativa ou na tribuna, tampouco podemos eleger outros para agirem como nossos substitutos nessa capacidade. Segue-se que não podemos também processar judicialmente quem quer que seja para forçá-lo a devolver-nos o que ele pode ter subtraído injustamente de nós; se ele levou nossa túnica, deixaremos com ele nossa capa ao invés de submetê-lo a punição.
Cremos que o código penal da velha aliança – olho por olho, dente por dente – foi ab-rogado por Jesus Cristo, e que sob a nova aliança o perdão ao invés da punição dos inimigos foi imposto a todos os seus discípulos em todos os casos quaisquer que sejam. Extorquir dinheiro dos inimigos, atirá-los em prisões, exilá-los ou executá-los, não é obviamente perdoar, é exigir retribuição.
A história da humanidade está repleta de evidências de que a coerção física não se adequa à regeneração moral, e que as inclinações pecaminosas dos homens podem ser subjugadas apenas pelo amor; de que o mal pode ser exterminado apenas pelo bem; de que não há garantia em confiar num braço forte a fim de nos preservar do mal; de que existe grande segurança em ser gentil, longânimo e abundante em misericórdia; de que apenas os mansos herdarão a terra – pois todos que empunharem a espada morrerão pela espada.
Portanto como medida de política coerente – pela segurança da propriedade, da vida e da liberdade – pela tranquilidade pública e pela satisfação privada – bem como em termos de lealdade àquele que é Rei dos reis e Senhor dos senhores, adotamos cordialmente o princípio de não-resistência, confiantes de que ele se mostra propício para todas as possíveis conseqüências, é armado de ilimitado potencial e triunfará em última instância contra qualquer ataque armado.
Não apoiamos as doutrinas dos jacobinos [partido revolucionário extremista da Revolução Francesa]. O espírito jacobino é o espírito da retaliação, da violência, do assassinato. Ele não demonstra temor a Deus nem consideração pelo homem. Tomamos como medida superior enchermo-nos do espírito de Cristo. Se toleramos o mal em concordância com nosso princípio fundamental de não opor o mal com o mal, não podemos tomar parte de qualquer sedição, traição ou violência. Demonstraremos submissão a toda e qualquer ordenança ou requerimento governamental, exceto quando se mostrarem contrários às ordens do evangelho, e em caso algum resistiremos à operação da lei, exceto submetendo-nos de bom grado à pena pela desobediência.
Porém ao mesmo tempo em que aderimos à doutrina da não-resistência e da submissão passiva aos inimigos, nós nos propomos, num sentido moral e espiritual, a atacar a iniquidade em lugares elevados e instâncias inferiores, a aplicar nossos princípios a todo o mal existente, a instituições políticas, legais e eclesiásticas, de modo a apressar a ocasião em que os reinos deste mundo passarão a ser o reino de nosso Senhor Jesus Cristo. Parece-nos verdade evidente que o que quer que seja que o evangelho foi projetado para eliminar em qualquer período da história, por mostrar-se contrário a ele, não deve ser abandonado. Se, então, prediz-se um tempo em que as espadas serão feitas em arados e as lanças em ferramentas de poda, e que os homens não mais aprenderão a arte da guerra, segue-se que todos que fabricam, vendem ou empunham essas armas de combate levantam-se desta forma contra o domínio pacífico do Filho de Deus na terra.
Tendo dessa forma declarado nossos princípios, prosseguimos especificando as medidas que propomos adotar para atingir o objetivo em questão.
Esperamos prevalecer através da Loucura da Pregação. Procuraremos divulgar esses conceitos entre todas as pessoas, de quaisquer que sejam as nações, seitas ou posições sociais a que pertençam. Organizaremos portanto palestras públicas, faremos circularem tratados e publicações, formaremos sociedades e enviaremos petições a todos os corpos governamentais. Será nosso objetivo primordial conceber modos e meios de efetuar uma mudança radical de conceitos, sentimentos e práticas sociais com respeito à pecaminosidade da guerra e o tratamento dos inimigos.
Ao nos lançarmos à imensa obra diante de nos, não ignoramos que ao persegui-la podemos ser convocados a ter nossa sinceridade testada ao ponto da mais ardente provação. Estaremos sujeitos ao insulto, à indignação, ao sofrimento e sim, à própria morte. Antecipamos uma não pequena parcela de incompreensão, de deturpação e de calúnia. Tumultos podem levantar-se contra nós. Os orgulhoso e farisaicos, os ambiciosos e tirânicos, os principados e potestades podem entrar em conluio para nos esmagar. De mesma forma trataram o Messias, cujo exemplo procuramos humildemente imitar. Não temeremos as suas estratégias de terror. Nossa confiança está no Senhor Todo-poderoso e não em homem algum. Tendo aberto mão de toda proteção humana, o que pode nos sustentar se não a fé que vence o mundo? Não estranharemos a ardente provação que vem para nos provar, mas nos regozijaremos em sermos participantes dos sofrimentos de Cristo.
Comprometemo-nos portanto a preservar nossas almas para Deus. Para cada um que abrir mão de casas, ou irmãos, ou irmãs, ou pai, ou mãe, ou esposa, ou filhos, ou terras por causa de Cristo, receberá cem vezes mais, e herdará por fim a vida eterna.
Com plena confiança no triunfo certo e universal das posturas expostas nesta declaração, por mais formidável que possa mostrar-se a oposição a elas, pela presente anexamos nossas assinaturas a ela, encomendando-a à razão e à consciência da humanidade, resolutos a, na força do Senhor Deus, calma e mansamente cumprirmos o exposto.
Boston, 1838
A «Sociedade de Não-Resistência» foi fundada por William Lloyd Garrison, que lançou também um jornal, o NON-RESISTANT, para propagar as suas ideias.
“Nem a sociedade nem o jornal resistiram por muito tempo”, conta Leo Tolstoi em seu «O Reino de Deus está dentro de vós,» onde encontrei a Declaração. “A maioria dos numerosos cooperadores de Garrison na causa da libertação dos escravos, temendo que o programa excessivamente radical defendido pelo jornal NON-RESISTANT mantivesse as pessoas afastadas das medidas práticas em favor da emancipação dos negros, deixou de professar o princípio de não-resistência como expresso na Declaração, e tanto a sociedade quanto o jornal deixaram de existir”.
Curioso é que tanto a Declaração quanto a ideia sobreviveram no livro de Tolstoi, que anos mais tarde foi lido por um sujeito que acreditou nelas e arriscou aplicá-las como haviam sido concebidas: Mohandas Gandhi, que mais tarde receberia o título de Mahatma.
As vitórias de Gandhi através do improvável princípio da não-resistência inspiraram ainda outro sujeito, o pastor Martin Luther King, que através dele conquistou as mais improváveis vitórias para o movimento dos direitos humanos nos Estados Unidos.
A Loucura da Pregação acabou atingindo uma pessoa ou duas, e as consequências mudaram a face do mundo.
A imagem que abre esse post é um quadro de Jacques-Louis David. Ele ilustra o Juramento de Péla, momento em que foi votada uma nova constituição francesa, em decorrência da revolução.