Olá amigos, eu sou o Felipe, e já escrevi um poste aqui sobre o FIQ 2015, e como todo dia ano tem eventos legais de quadrinhos, cá estou de novo para falar sobre um desses eventos maravilhosos: a Bienal de Quadrinhos.
Dessa vez não vou me ater a descrever todos os aspectos e funcionamentos do evento, pois acredito que muita gente boa já fez isso (indico a leitura da matéria do Estadão e do post da Lady’sComics). O que me interessa mais é falar sobre o que o evento representa na cena de quadrinhos nacionais e sobre a experiência que ele proporciona.
Antes Gibicon, agora Bienal de Quadrinhos
A Gibicon mudou. Já era um dos maiores eventos exclusivos de quadrinhos do país, e com a mudança para Bienal de Quadrinhos, ela apenas se consolidou nesse patamar.
A mudança foi muito mais que apenas nominal, ela mexe também com o foco do evento. A Bienal trouxe uma nova dimensão para o evento, que vai além da feira de quadrinhos e dos debates (importantes) sobre a situação do mercado de HQs. As palestras apresentadas trazem uma discussão mais ampla sobre a relação que os quadrinhos – como meio cultural – têm com a realidade social onde estão inseridos. Durante o evento, foi possível acompanhar mesas e debates com temas como feminismo, narrativas negras e conflitos de terra, todos através dos quadrinhos.
A preocupação da Bienal foi muito além de apenas inserir mesas com temáticas especificas. Sentia-se também nas exposições a preocupação em trazer temas diversos, como a exposição “Expostas” e o trabalho do ilustrador Shiko, cuja temática trazia a representação negra na obra do autor.
Posto isso, quero destacar outras coisas boas do evento. Quero ressaltar o alto nível das mesas e palestras, ao menos a maioria delas. Destaco também a palestra com a cartunista Laerte, a mesa sobre “Conflitos de Terra” e o debate com editores de quadrinhos. Todos esses espaços trouxeram um nível alto por parte dos participantes e do público. Na mesa de editores, fomos apresentados a importante pauta da distribuição de revistas no Brasil e a crise da DINAP, com seu atraso cada vez mais freqüente nos pagamentos. No debate sobre conflitos de terra, apresentou-se um panorama histórico sobre a revolução mexicana e sobre os conflitos decorrentes do extrativismo no Equador. O nível desta apresentação foi tão elevado, que poderia estar dentro do cronograma de um curso de História. Na entrevista com a Laerte, vimos uma reflexão de como movimentos sociais e a esquerda política tem esquecido de incluir os trabalhadores nos debates, tornando-se fechadas no próprio gueto.
Outro ponto agradável desses eventos são os quadrinistas e a possibilidade de interação do público com eles. Isso me faz gostar ainda mais desse universo dos quadrinhos! A possibilidade de encontrar com alguém que você gosta do trabalho e trocar ideias sobre aquilo ou sobre qualquer outra coisa, é um dos fatos mais cativantes deste meio. Tive a possibilidade de passar um tempo junto com os amigos do coletivo Velociraptor Pirata (um beijo no coração desses lindos). Ver a dinâmica pelo lado oposto (de quem produz) também é muito interessante! Acompanhar a relação entre quadrinistas, a troca de experiências, artes e etc. é muito motivador.
Pontos para melhorar
Mas nem tudo foram flores na Bienal de Quadrinhos. Ocorreram alguns problemas durante o evento, sendo para mim o principal deles o local (Museu Municipal de Artes). A Bienal já é maior que o local onde ela é realizada. Prova disso é a necessidade de fazer uma enorme tenda no estacionamento para comportar os maiores stands do evento: editoras, lojas e um palco de debates e mesas. Algumas cabines dos banheiros também não funcionavam, o que resultou em filas constantes nos banheiros. Notou-se também a falta de bebedouros e dificuldades na acessibilidade (visto que o evento era realizado em um local com diversos pavimentos. Com o crescimento do evento e de artistas expondo seu material, muitas mesas de quadrinistas ficaram em um setor externo de um dos andares. Se na edição de 2014, o frio e a chuva atrapalharam os artistas, neste ano o calor e o sol tornaram o período de exposição na área externa dificultoso. É importante ressaltar que a disposição dos ambientes foi mais bem pensada este ano, mesmo se considerarmos o aumento considerável de publico e artistas circulando por toda a região do evento. O alto volume de pessoas não incomodou ou impediu o trânsito pelos diversos ambientes do evento.
A Bienal é cultura!
Quem foi a Bienal percebeu várias urnas espalhadas por todo o MuMA Elas surgiram diante da necessidade do evento recolher doações financeiras, frente a dificuldades em conseguir apoios para a realização do evento. O foco da Bienal de Quadrinhos, assim como o FIQ (Festival Internacional de Quadrinhos), é muito mais cultural do que comercial. Esta característica da Bienal torna ainda mais difícil a realização desse tipo de evento num cenário de crise econômica no país. Com a proximidade das eleições municipais, vários candidatos deram as caras no MuMA durante o evento. Mas fica a questão: o que mais é necessário para a Bienal ser considerada um evento cultural da cidade? É possível garantir a continuidade da Bienal? Para o mercado de quadrinhos no Brasil, me parece fundamental que um evento desse porte tenha sua continuidade garantida, e não apenas isso. É necessária também a transferência da data para o primeiro semestre. Explico: anualmente, em meados dezembro, ocorre a CCXP (ComicCon Experience), evento de porte muito maior e com vistas claras ao mercado e relações comerciais. Com esta proximidade de datas, a tendência é que eventos com menor apelo comercial e fluxo de dinheiro (Bienal de Quadrinhos) sejam esvaziados e atraiam menos público.
Conclusão
O saldo do evento é positivo! A Bienal de Quadrinhos de Curitiba ‘nasce’ fazendo bonito e movimentando o cenário de quadrinhos. Faço votos de que seja apenas o começo de uma bela história (em quadrinhos) que com certeza, ainda tem muito para crescer.
Serviço:
Bienal de Quadrinhos de Curitiba
Quando? 08 a 11 de setembro de 2016
Onde? MuMA (Museu Municipal de Artes) – Curitiba/PR
Informações? www.bienaldequadrinhos.com.br
Felipe Amorim é professor, historiador, fã de quadrinhos e sommelier de leitura de comentários.
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