Crônica 4

Há um tempo atrás eu li o livro Orgulho de ser Evangélico, do Ricardo Gondim.

Em um dos textos do livro ele afirmava que o movimento pentecostal era uma segunda reforma. Se a gente olhar historicamente, a reforma de Lutero trouxe a figura de Jesus e da liberdade cristã de volta pra cena, e talvez o movimento pentecostal trouxe de volta a figura do Espírito Santo.

Aconteceram várias bizarrices com o movimento pentecostal — assim como aconteceu logo depois da reforma, basta lembrar das guerras e perseguições, abandono da arte, dualidade sacro x profano — mas, no começo desse movimento, existia uma organicidade, uma vida muito simples onde as coisas aconteciam simplesmente porque as pessoas precisavam ficar preocupadas com mais nada, pois Deus, através do Espírito Santo, iria prover tudo o que fosse necessário. Lá pela década de 30 e 40 nos Estados Unidos não era muito difícil ter uma guitarra ou uma bateria nos louvores das igrejas porque os grupos de louvor eram super punks, qualquer um que tivesse um instrumento e tivesse afim podia chegar e tocar, as portas estavam sempre abertas.

A situação atual das pentecostais (e das neo-pentecostais) não condiz com a raiz desse movimento, assim como as denominações históricas não se comportaram exatamente como seus fundores pretendiam (veja a influência que o Calvinismo teve na implantação do capitalismo — quantos pastores americanos vêem o consumismo como problema?). Pelo que eu percebo a igreja em geral anda se debatendo pra não morrer, a igreja contemporânea é um instituição falida, as neo-pentecostais estão preocupadas demais com o dízimo, as pentecostais se perderam na falta ou na fraqueza teológica e as históricas engessaram, todas vivem uma falta de visão que resulta numa pobreza imensa do evangelho.

Penso que o problema desses movimentos é justamente na interpretação errônea dos reformadores. Jesus não trouxe nenhuma novidade, a misericórdia de Deus já vinha sendo pregada desde os profetas e estava presente já na expulsão do paraíso (quando deveríamos ter sido mortos ao invés de expulsos). Jesus é a própria misericórdia, o próprio Deus que se limita à humanidade, fazendo milagres a partir da fé de seus seguidores infiéis. Nas reformas se abandonava completamente velhas práticas em favor das novidades dos reformadores, a confissão dos pecados ao padre ou o uso e o patrocínio das artes foram abandonados pelas seguidores de Lutero, o estudo da palavra foi abandonado pela inspiração do Espírito Santo, novidades que sacrificaram antigas tradições que faziam muito bem para o crescimento na fé. A Boa Nova vem sendo pregada desde o princípio, é a mesma verdade que nunca muda e nunca vai mudar, não precisamos de novidades, precisamos voltar à essência, àquele plano divino que o Criador escreveu antes das coisas serem criadas…

Não quero uma nova reforma, não preciso de novos Luteros, Calvinos, Kierkegaards ou Padillas. Preciso da Palavra que se fez carne, que já estava aqui antes do princípio que nunca passa e nunca deixará de existir e agir com a mesma misericórdia que permita que eu, pecador, carente de graça e de salvação, seja porta-voz de uma Verdade que não mereço e que não cabe em mim.

Kyrie eleison

A imagem que ilustra esse post é a obra “Golpeie os brancos com a cunha vermelha” de El Lissitsky — construtivista russo.

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