Não… não é que eu goste de ser do contra, apenas pelo prazer de “ser do contra”, tem muita coisa na igreja que eu gosto muito, e diferente do que acreditam alguns críticos, nem tudo que faz sucesso e ruim, necessariamente, pra mim… Contudo, tudo tem limites nessa vida, e um dos meus limites é compreender a necessidade deste evento chamado MARCHA PARA JESUS, que acontece pelo Brasil (e pelo mundo) inteiro…
Ora, primeiro de tudo, é de vital importância termos a compreensão de que a igreja cristã evangélica tem N expressões, N teologias e muitos outros aspectos que fazem com que se protejam em baixo de um mesmo título, grupos das mais diferentes maneiras de pensar a relação do homem com Deus, do homem com seu semelhante e da sua comunidade com o restante do mundo, e assim, não tenho como generalizar e me auto-intitular o porta-voz da fé evangélica, pois isso seria tão idiota quanto quando o sr Silas Malafaia se auto intitulou como representante dos valores defendidos por esta classe. Ora, maior absurdo não encontro, visto que muitas das cruzadas que este senhor promove estão diametralmente opostas a tudo que eu julgo como urgente em se tratando dos meus objetivos enquanto cristão e sendo assim, como não me sinto representado por este senhor, também não espero que todos os evangélicos do brasil me aceitem como tal, simplesmente, numa estratégia sartriana, tentarei sr o melhor possível naquilo que sou, e tentarei ser, evangélico.
Vamos a alguns fatos:
Os protestantes, de modo geral, tem na bíblia, sua unica referencia de fé e prática, ou seja, em oposição aos católicos, com sua tradição, os protestantes (que também tem suas tradições) se focalizam nos textos bíblicos. Na prática isso é uma grande ilusão, pois mesmo igrejas mais novas tem suas tradições, e acabam expressando-a na sua liturgia e em suas vidas cotidianas e a diferença básica está no ponto de consegui, conscientemente, dar cada vez menos valor às tradições e evidenciar a bíblia, mesmo que para isso seja necessário reformar a igreja a cada tantos anos, seguindo uma máxima reformada
ecclesia reformata et semper reformanda est
Contudo, o que vejo em muitas igrejas que encontro, seria melhor traduzido como “Não se mexe em time que está ganhando”, mesmo que não se saiba exatamente, quem é que está ganhando, com essa postura.
E assim, começos a questionar a questão da MARCHA PARA JESUS.
Não há qualquer referencia bíblica da parte de Jesus ou da parte de qualquer apostolo ou profeta que indique a necessidade de, enquanto igreja, organizarmos uma marcha pela cidade que junte todos (ou grande parte) dos cristãos, a não ser que consideremos uma analise muito subjetiva para isso, com textos do antigo testamento que na prática não fazem nenhuma menção a um evento como o que vemos hoje em dia… Contudo, isso não é argumento suficiente para ser contrário a marcha, visto que: outras tantas coisas que o texto bíblico não menciona, mas utilizamos, e estas tem sido de grande valia para o avanço e crescimento da igreja. Jesus nunca disse para usarmos equipamentos elétricos ou eletrônicos, mas com eles conseguimos ampliar nossa voz, ou nos fazer vistos para milhares de pessoas que não teriam acesso físico a nossas igrejas, e mesmo considerando que a igreja é expressada numa RELAÇÃO, o anuncio do evangelho enquanto noticia (ou seja, destituído de sua integralidade) é facilitado. Pois então, por que ser contra a MARCHA mesmo não sendo contra microfones, projetores e internet?
A questão toda não está na MARCHA em sim, mas no intuito por trás dela.
Por exemplos: Apontar uma arma para uma pessoa e ameaça-la de morte, é um pecado? Sim? Não? Bem… A resposta é DEPENDE! Se o teu intuito for assaltar a pessoa que é ameaçada, a resposta será SIM, com certeza, de outro modo, se o objetivo for, impedir que essa pessoa faça mal para alguém, na posição de policial, a mesma atitude não é um pecado, mas pelo contrário, uma virtude, a de cumprir com suas obrigações profissionais assim como salvar a vida de um terceiro. Aplicando a mesma lógica para a MARCHA PARA JESUS.
Qual é o objetivo deste evento? Proteger ou ameaçar?
Ora, não tenho condições de esquadrinhar o coração das pessoas, não tem como saber o que cada um pensa ou intenciona fazer, mas posso verificar dados e assim como fazemos em outros aspectos da nossa vida, posso ler a situação e com permissão e muito temor para não ser injusto com ninguém, expresso as coisas que tenho visto nesses últimos 3 anos em que estive presente, não na marcha, mas me opondo a ela.
Com a presença de muitos políticos durante a marcha e sobretudo, no final desta, compreendo que mais do que simplesmente uma festa do povo de Deus, a marcha tem sido uma maneirade mostrar às autoridade politicas o poder de influencia que lideres religiosos evangélicos tem, e como podem até, mudar o rumo de uma ou outra eleição, como já vimos acontecer até na eleição presidencial. Não sejamos inocentes… Imagine-se como prefeito ou vereador de uma cidade, você desprezaria a chance de se tornar simpático aos olhos de um homem que controla a moralidade e as vezes até a intelectualidade de milhares de pessoas? a resposta honesta é apenas uma. Claro que não… Qualquer profissional de politica que tenha um plano de poder terá as melhores e mais elaboradas palavras na ponta da lingua para tratar com estes homens, e até dar-lhes as maiores e melhores vantagens e mesmo sabendo que nem todo pastor é corrupto, numa logica muito clara, qualquer um pode se corromper, pois são todos seres humanos, como você e eu, e achar que um titulo de pastor confere poderes sobre humanos, é uma ingenuidade mais que absurda. Assim, os relacionamentos entre POLÍTICOS e PASTORES (ou lideres de qualquer tipo) são amplamente prejudiciais quando são estabelecidas nesses termos, contabilizando votos e membros numa relação direta.
Mas alem da relação PASTORES e POLÍTICOS temos também os PASTORES POLÍTICOS, homens e mulheres que se utilizam de sua influencia dentro das igrejas para subir a cargos políticos com a desculpa de DEFENDER OS VALORES EVANGÉLICOS. como disse no inicio do texto: Quais são os valores evangélicos? Bobagem achar que temos uma unanimidade, esses homens e mulheres que se utilizam de um cargo que lhes foi conferido mediante um dom dado por Deus para se tornarem profissionais da politica, em muitos casos estão preocupados muito mais com os interesses de suas congregações locais, interesses esses que, enquanto lideres, eles mesmos definem: Por uma matemática muito simples, se utilizam do povo dessuas igrejas para manter seus interesses próprios. A relação entre POLÍTICOS e PASTORES que citei a pouco, que ainda que preocupante pode se dar com a mediação de outras pessoas, caso o politico e o pastor em questão tenham viabilizado essas intervenções, no caso de um POLITICO PASTOR, acaba acontecendo dentro de um campo onde nenhum outro homem pode acessar, dentro da cabeça do próprio POLITICO PASTOR.
E os shows? Muitas (não sejamos hipócritas) muitas mesmo, das pessoas que vão à marcha, só estão indo para ver os seus ídolos cantarem… Não tenho problemas em ser fã deste ou daquele artista, seja ele gospel ou não, contudo, EXATAMENTE no contexto dessas negociações subliminares entre a politica e a igreja, termos um grande artista para abrilhantar ainda mais o evento, atrair ainda mais pessoas e tirar o foco ainda mais de todas as questões em que a igreja e a politica estão atuando, não é um pouco suspeito? Será que é exatamente esse tipo de expressão de adoração que é digna e santa a Deus? Ou será que essa musica é apenas uma maneira de deixar ainda mais alienado o povo de Deus?
DEVERÍAMOS ACABAR COM A MARCHA, NA SUA OPINIÃO?
Novamente evidencio, que NA MINHA OPINIÃO, a marcha é uma grande oportunidade que nós enquanto cristãos estamos jogando no lixo em troca de visibilidade politica e show de astros gospel grátis.
A igreja cristã não é um ambiente meritocrata e hierarquizadora, o proprio cristo diz que devemos “considerar o próximo como superior”, e ainda, “aquele que quiser ser o primeiro, que seja o ultimo” numa referencia óbvia de que a a humildade deve prevalecer no ambiente em que se pretende estabelecer o reino de Deus na terra… Não temos, assim, como concordar com algumas coisas absurdas que vemos na marcha, pastores com seguranças particulares, carros de som que custam mais do que o salario do semestre de alguns membros daquela igreja entre outras…
Uma marcha para Jesus EFETIVAMENTE seria feita por homens e mulheres IGUAIS andando LADO A LADO e com o objetivo de ESTABELECER O REINO DE PAZ E JUSTIÇA na terra, através de atos de PAZ e de JUSTIÇA, conforme o exemplo que o próprio Cristo deu, nos evangelhos, nas suas tantas caminhadas pela região onde estabeleceu seu ministério. Sem comprometer-se com este ou com aquele politico ou partido, A IGREJA, que e constituída pela soma de todas as instituições evangélicas, deveria estabelecer metas de PAZ e de JUSTIÇA através das palavras de CRISTO contida no texto bíblico através do relato de seus biógrafos nos 4 evangelhos, e enquanto cristãos, imitar a cristo no objetivo de alcançar essas metas, como CORPO DE CRISTO.
A marcha não deveria ocorrer no centro de Curitiba, mas na periferia, em lugares onde o estado fecha os olhos para a questão da saúde de milhares de crianças que não são atendidas devidamente nos postos de saúde desde antes de nascerem, ainda no ventre de suas mães e erguer sua voz profética para que os lideres da cidade e do estado ouçam o clamor dos filhos de Deus que seguem a Cristo. Deveríamos marchar onde a violência urbana mata jovens pobre e na sua grande maioria negros, colocando-os numa encruzilhada fatal em que de um lado estão as dificuldades de uma vida honesta num contexto de esquecimento do estado e poroutro as facilidades do crime e o risco de vida eminente e enquanto arautos das boas novas, estabelecer profeticamente que a violência terá um fim naquele lugar por conta da presença da igreja de Cristo. Marchar e bater firmes com o pé no chão diante das injustiças cometidas contra os professores e demais funcionários da educação que são vitimizados com salários ridículos e condições precárias, e carregam nas costas nada menos que a expectativa do futuro do país, enquanto os lideres poliiticos que estamos abraçando do alto dos carros de som, estão rindo da vexatoria situação por qual estes homens e mulheres da educação são obrigados a passar todos os dias. Por fim: Não são poucos os problemas que uma marcha para Jesus seria capaz de, profeticamente, denunciar aos lideres do estado, em cada esquina tem uma injustiça, em cada bairro e em cada cidade a igreja poderia ser o limite entre a vida e a morte, contudo, temos preferido dançar, rir e brincar, e enterrar nossos talentos profeticos, e não é nem por medo do nosso Senhor, é simplesmente por ignorar a sua vontade por completo, enquanto ignoramos a injustiça que acontece a alguns metros da porta das nossas igrejas…
Que Deus tenha piedade de nós