Quem é Paulo?

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Sinceramente, faz pouco tempo que deixei de ter o pé atrás com os escritos paulinos. O excesso de Paulo que se vê na igreja evangélica faz com que esse autor essencial à fé evangélica seja mal interpretado e lido de forma tendenciosa enclausurando o ensinamento cristão.

Com certeza Paulo era um cristão radical, sim; certamente era contra práticas que não fazem bem ao nosso corpo e espírito; mas definitivamente Paulo não era tão farisaico como gostam de lê-lo, nem tão “certinho” como gostam de pintá-lo.

Paulo, assim como Jesus, era um progressista e definitivamente mexia com a ordem estabelecida das coisas. Paulo era sim aquilo que chamaríamos de um revolucionário e não há como negar esse título ao apóstolo, basta atentar a alguns dos seus pedidos: não paguem o mal com o mal, calma perante a ira, não responder na mesma moeda nem alimentar vingança, colocar a mulher lado a lado com — ou melhor, com mesmo valor que — o homem, pedir respeito pelos nossos escravos, servos ou empregados e não abuso por direito mas uma boa convivência no ambiente de trabalho* e outros mais que recheiam as cartas paulinas. Em suma, Paulo pede para que não sigamos nossos instintos, mas seguremos as rédeas para que o amor pregado por Cristo possa agir não só na nossa vida mas também na do próximo. Disciplina e não seguir nossa natureza é algo que sempre foi impopular, a diferença de Paulo é que seus pedidos não são por mérito ou pra agradar a Deus ou pra chegar à um nível espiritual acima dos outros, mas pela fé, pela esperança e pelo amor, pois assim a vida de todos poderá ser transformada.

Aprofundar todas as situação e tomar essa via educacional, que é o caminho tomado por Paulo em suas cartas, é algo pra lá de incomum; querer que aqueles que nos ouvem adquiram o mesmo conhecimento que nós é querer sua própria irrelevância, é aquele desejo inocente que todos conheçam a Cristo de tal forma que ninguém mais precisa de mais nada além do próprio Cristo, algo impossível de se imaginar e muito além da nossa pobre imaginação (mas por favor, não deixe de tentar imaginar esse lindo cenário).

Muito provavelmente Paulo parece muito mais como um líder de um movimento um tanto quanto anárquico† do que um líder de algo hierárquico e extremamente organizado como a igreja se estabeleceu com o tempo. Paulo nunca toma pra si a cartada final, mas prefere colocar recomendações no lugar de leis; faz questão de explicar e aprofundar as situações que são destrutivas aos seres humanos; como Jesus, vai ao âmago das questões e não condena as aparências pelas aparências; prefere apontar a liderança do movimento pra alguém que não está mais entre nós do que assumir pra si a responsabilidade que nunca foi de ser humano nenhum: a responsabilidade de guiar os novos cristãos após a ascensão do nosso representante maior aos céus, responsabilidade essa que sempre foi e sempre será do próprio que ascendeu.
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* Sinceramente, me parece muito estranho não atualizar termos como escravos ou servos para nossa atual situação de trabalho. Mas isso não tem nada a ver com esse texto.

† Anárquico não num sentido bagunçado ou sem-líder, mas descentralizado, com vários líderes, com um hierarquia generosa e não rígida, com decisões abertas e discutíveis, lutando pelas batalhas certas e não com a incosequência de “não toque no ungido” e foco em causas secundárias.

A imagem que ilustra esse post é do pintor holandês Rembrandt e se chama Auto-retrato Como Apóstolo Paulo

Kyrie eleyson.

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