A inerrância das Escrituras

Saiu um vídeo com Caio Fábio falando que a bíblia não é inerrante. Em blogs apologetas e loucos pela sã doutrina pipocaram textos corrigindo tamanha heresia. Esses blogs nem deixaram brecha para que os pobres evangélicos perdidos da internet possam sequer em um segundo duvidar que a bíblia pode conter erros.

Ainda não vi o vídeo, sei lá se vou ver, li dois textos sobre o assunto, e algumas coisas parecem que simplesmente não são mencionadas nas argumentações da inerrância da bíblia; parece que alguns fatos são intencionalmente deixados de lado para que ninguém possa por a prova nosso livro sagrado que é fundamental para nossa fé sem o qual sequer teríamos conhecimento da Verdade (será que não?).

Caminhos pedegrosos esses que você anda, hein, senhor Gustavo.

Primeiro gostaria de deixar claro que acredito na bíblia como palavra de Deus, creio que ela, como objeto original, não contem erros; mas, como qualquer produto feito por mãos humanas — por mais que a bíblia foi inspirada por Deus, ela foi manufaturada por homens e mulheres, seus personagens e autores são homens e mulheres tão pecadores quanto nós, todos merecedores do inferno, assim como nós — contém seus poréns.

Bibo, em sua crítica a pregação de dízimos do Malafaia, postado também aqui nesse amado blog, aponta em sua critíca o erro exegético de Malafaia ao fundamentar sua pregação em uma só tradução da bíblia. Isso logo deixa claro que algumas traduções não são tão confiáveis ou nenhuma tradução é 100% fiel a bíblia original — aliás, muitos tradutores, não sei se todos mas a maioria, diz que traduzir é interpretar, os mais radicais dizem que ler é interpretar, e interpretações já se distanciam do texto original fazendo que “erros” apareçam.

Outra questãozinha é que a língua está presa a uma cultura, expressões e palavras mudam de significado no decorrer dos tempos (e da evolução da cultura), fazendo que algumas coisas que lemos hoje não necessariamente eram lidas dessa forma quando essas coisas foram escritas (surge daí o tal método histórico-crítico de interpretação da bíblia). Isso quer dizer que o hebraico lido pelos hebreus no tempo do Antigo Testamento não necessariamente é o mesmo hebraico que lido por nós em nossos dias. Essências podem ser extraídas, mas o significado fidedigno de algumas coisas foram apagados pelo tempo e pela mudança de cultura.

E por último, quando os autores do Novo Testamento nos pedem para ter as Escrituras como direção, essas Escrituras são os escritos do Antigo Testamento — que nem estava organizado em um só livro ainda — e não a bíblia como a temos hoje.

Esses três poréns são apontamentos que qualquer estudante de teologia aprende — ou deveria aprender — na faculdade; isso, eu aprendi de pastores e amigos, gente que estuda a bíblia e que tem diploma (não que eu seja desses que dá muito valor pra diploma) ou curiosidade pra isso. (Tem coisas mais hardcore, polêmicas demais, que prefiro não comentar.) Essa informações estão aí disponíveis para quem quiser ver, mas me parece que alguns fazem questão de escondê-las, não sei se por falta de fé ou por não conseguir responder as dúvidas que podem surgir desses questionamentos.

Apesar desses poréns, caro leitor, a palavra se fez carne, andou e anda entre nós guiando sua santa Igreja pelas caminhos sonhados pelo Divino. A bíblia não perde valor por suas limitações, pois ela não veio sozinha, sua leitura vem acompanhada da oração, meditação, jejum, comunhão e outras disciplinas que nos ajudam a sermos guiados pelo Espírito Santo de Deus a sermos imitadores daquele para qual a bíblia aponta como o Caminho, a Verdade e a Vida. Pois afinal, ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo (1 Coríntios 3. 11).

Kyrie eleison

A imagem que ilustra esse post é a belisssíma bíblia de 42 linhas, primeiro livro impresso no Ocidente pelo grande Gutenberg.

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