Um livro que ainda está para ser escrito sobre a história da ação social e a luta dos evangélicos no Brasil por justiça, certamente retratará a contribuição da Diretriz Evangélica, movimento liderado basicamente por batistas, mas com amplas relações com outros grupos evangélicos e a sociedade brasileira.
O movimento já era atuante no final dos anos 1940, antes de entidades e movimentos reconhecidos, como a Rede Evangélica Nacional de Ação Social (Renas), a extinta Associação Evangélica Brasileira (AEvB), a Visão Nacional de Evangelização (Vinde), o Pacto de Lausanne e a Missão Integral da Igreja, a Teologia da Libertação e o Setor de Responsabilidade Social da Confederação Evangélica do Brasil darem suas contribuições sociais.
Organizado a partir do Rio de Janeiro, então capital do Brasil, o movimento teve entre seus pioneiros David Malta Nascimento, Lauro Bretones e Himain Lacerda, que lançaram em janeiro de 1949 o primeiro número do jornal “Diretriz Evangélica”.
Entre os pontos do decálogo que identificava e orientava as ações do grupo, destacam-se: 1. Cremos no Evangelho de Cristo, o programa do reino de Deus, como única solução para os problemas individuais e coletivos; 2. Cremos na dignidade da pessoa humana, por isso que dentro dos postulados do cristianismo condenamos todo e qualquer sistema político-social e religioso que a negue; 3. Cremos que o cristianismo, por ser uma mensagem integral, tem um duplo objetivo: regenerar o indivíduo, salvando-lhe a alma, e santificar as relações sociais do homem.
Com base nestes princípios Diretriz Evangélica manteve várias atividades como publicação do jornal, programa radiofônico, colunas em “O Jornal Batista” e outros veículos de informação, como a revista paulista “Unitas”, de direção presbiteriana.
Em consonância com as ações e princípios do movimento, as igrejas pastoreadas por seus líderes, e outras, como a de Benilton Carlos Bezerra e a de Hélcio da Silva Lessa, que se associaram ao grupo, estabeleceram atividades de assistência e serviço social, sempre visando as transformações estruturais.
No início da década de 60 o movimento publicou “Ação Social Cristã”, um livro corajoso e pioneiro, de autoria do pastor Hélcio Lessa, cuja capa trazia a foto de uma típica favela carioca. Este livro tornou-se uma referência por, entre outras contribuições, oferecer uma conceituação distinta fundamental do que seja assistência, serviço e ação social.
Por causa dessa consciência e tomada de posição, os líderes da Diretriz Evangélica sofreram pressões e críticas, tanto do meio batista e evangélico, quanto de setores conservadores da sociedade. Após o Golpe de 64 o movimento começou a se arrefecer, por razões de intolerância e perseguição no país. Taxado de comunista — uma acusação temerária para a época — o grupo ainda resistiu e manteve algumas ações, mas principalmente dentro de suas igrejas.
No entanto, seus sonhos e contribuições por um evangelho integral se mantiveram e frutificaram. Exemplo disso foi o recente encontro realizado em 16 de junho de 2009, no Seminário Batista do Sul, no Rio de Janeiro: uma mesa de reflexão sobre as ações da Diretriz Evangélica e a celebração de um culto a Deus em que foram também homenageados alguns remanescentes, como o pastor David Malta Nascimento, que completou 90 anos. Na ocasião foram distribuídos um boletim especial com textos do movimento e o livro “Ação Social Cristã”, doado pela família do pastor Hélcio Lessa, morto em 5 de junho de 2009, com quase 83 anos.
Ao relembrar movimentos como este, nossa geração é outra vez desafiada a fazer mais e melhor pela justiça do reino de Deus. Afinal, as diretrizes evangélicas para esta ação são dadas pela própria Palavra de Deus, que exige eficaz cumprimento de todos quantos se identificam como seguidores de Cristo.
Nota
Os documentos citados e o livro “Ação Social Cristã” estão disponíveis em www.ftlrj.blogspot.com e www.ftl.org.br
• Clemir Fernandes, pastor batista e sociólogo, é coordenador da Rede Evangélica Nacional de Ação Social — Rio de Janeiro.
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