Trabalho em um hospital como enfermeiro há aproximadamente 4 anos e nesse tempo já presenciei a felicidade da vitória de alguém frente a morte mas também as agruras de quem perde esta batalha dia a dia. Não é incomum a visita de sacerdotes que fazem orações suplicantes a Deus pela cura ou ao menos pelo alento do paciente que ali se encontra. Certa vez passei a tarde pensando em como seria quando e se chegasse a esse ponto em minha vida, digo hospitalizado, ou se meus entes mais queridos acabassem passando por isso. Gabo-me freqüentemente de não temer a morte, mas evidentemente digo isso porque ela para mim parece distante e não uma realidade palpável a curto prazo. De qualquer forma pensei em muitas situações que me faria questionar a justiça divina:
E se meu filho nascesse com uma moléstia terminal? E se minha esposa fosse arrancada de meus braços por uma fatalidade? E se eu morresse amanhã antes de completar os milhares de sonhos que guardo em meu íntimo? Para cada uma destas situações confesso que me enfureceria muito com Deus, e considerava isso um de meus grandes defeitos até ler um trecho de um texto de Roy Lawrence o qual peço licença humildemente para transcrever:
“Tenho o privilégio de ser sócio de um grupo na Inglaterra chamado Associação Santa Columba. Seus membros atuam como atendentes ou exercem outras funções em hospitais para pacientes terminais. Minha mulher e eu as vezes somos convidados para falar nos encontros da associação.
Numa dessas ocasiões, ouvimos o capelão desses hospitais contar a história de um paciente que pediu para conversar com ele porque sentia profunda angustia. Estava nos estágios terminais de um Câncer e sentia muita culpa por ter passado a noite anterior xingando, delirando e blasfemando contra Deus. Na manha seguinte, sentiu-se péssimo. Imaginava que a probabilidade de obter a vida eterna a essa altura era definitivamente nula, pois Deus jamais perdoaria alguém que o amaldiçoara e ofendera.
O capelão perguntou ao paciente:
-O que é, em sua opinião, o oposto de amor?
-Ódio (Respondeu o homem).
Com muita sabedoria o capelão replicou:
– Não, o oposto de amor é indiferença. Você não foi indiferente para com Deus, caso contrario não teria passado a noite falando com ele, dizendo-lhe com sinceridade o que estava em seu coração e sua mente. Você sabe qual a palavra cristã para descrever o que você fez? É oração. Você passou a noite orando.”
A impressão que tenho é que, para alguns, perante a morte toda religiosidade cai por terra.
Ainda bem!