Antes de perder o chão

Agora estou aqui, no topo deste prédio. Os dois caminhos que tenho, pra mim, são covardia. Se falto o chão, sou covarde. Se desisto e volto, idem.

Minha visão é embaçada, mas ainda bem me lembro de todas as coisas.

Se eu fosse dono da minha emoção… Ah!

Maldito o dia em que cruzei o olhar com o dela. Desse cruzamento nasceu um filhote de luz. Ela ofuscou meu rosto, seu sorriso tinha luz. A luz bateu aqui dentro, suas palavras eram tão amáveis que a linha curva positiva que se formou em mim, traiu meu maravilhamento.

Há dez minutos apenas, estava parado no pé da escada do último andar desse prédio. Decidindo pela vigésima sétima vez se subia mais um andar ou não.

O filhote de luz me devorou. Baixei a guarda rapidamente e suas palavras entraram em mim. Fiquei anestesiado. Acho que estava gostando da companhia dela, apesar de não compreender nada do que ela me falava. Sempre fui orgulhoso. Sempre gostei de mostrar a todos que tinha minha própria opinião e debater ferozmente quem me contrariava. Dessa vez, não.

Dentro do elevador subindo, tocava uma música que dizia sobre um amor incondicional. Quando entendi o que era, sai correndo e passei a subir pela escada.

Nos primeiros meses, eu era como um liquidificador ligado. Ela sabia argumentar e eu besta, encantado com a esperança que ela exalava. Já não compunha músicas tristonhas, achei muito trash. Na verdade, não sabia mais o que compor. Foi nesse ponto que o alerta soou.

Cheguei ao prédio e automaticamente olhei no relógio. Mania minha, olhar pro pulso só por olhar e não ver realmente que horas são. Entrar foi moleza, ninguém se deu o trabalho de ver pra aonde eu ia.

Me dei conta de que estava doente. Essa luz dessa menina clareou o que não devia, dentro de mim. Quando não consegui mais compor, o vírus da minha doença se rebelou. Foi quase um ano de batalha interna. Eu fugi dela várias vezes, mas, que adianta? Ela sabia onde me encontrar, rapidamente aprendeu meu ponto fraco. E toda vez que me encontrava, aquele sorriso me iluminava, suas lágrimas tocavam o sentimento… Ela se sentia aliviada por me ver. E as palavras? Consigo trazia sempre o filhote de luz.

Olhei pela última (última?) vez a frente da minha casa. Não sei se podia chamar de lar, mas, era um teto. Deixei a chave na caixa de correio e ganhei a rua. Resolvi ir a pé, pra remoer mais um pouco a dor.

Tava errado! Fiquei confuso! Como ela conseguiu tirar meu chão assim? O tempo passava e cada vez mais precisava da companhia dela, das palavras dela. Mas tudo o que me dizia, toda essa luz, fazia minha cabeça entrar em parafuso! Mexeu com tudo o que sempre acreditei ser certo!

Assinei a carta. Na última folha daquele caderno velho de escola, rabisquei meus motivos e deixei uma mensagem pra ela. Não sabia se ela encontraria a carta primeiro ou…

Ela me confrontou naquele dia. Falou abertamente da Esperança. Eu não queria acreditar, mas era claro! Toda essa luz e o que ela queria fazer era me dar a visão, me tirar o escuro. Esse escuro em mim, se rebelando contra o filhote de luz. Essa batalha, esse sorriso… ah, as lágrimas, as palavras… Tudo tão vivo, a Esperança viva e…”

 

– NÃO! NÃO PULA!

– Como me encontrou tão depressa?

– Isso não importa agora, vim te buscar!

– Não posso, vou ganhar o ar e você não vai mais precisar se preocupar comigo.

– Larga de ser maluco! Não pode ser o fim, mal começou!

– Você quer dizer, “começou mal”. Não tenho esperança, pare de me enganar!

– Eu sei o que você sente. A luz te incomoda. Não sossego enquanto você não descer daí e entender que a mesma Esperança que encontrei, te chama!

– Me chama? Como pode ter tanta certeza?

– A luz brilha para todos, mas só alguns tem a coragem de olhar. Dos que olham, poucos sustentam. Os que sustentam ficam deslumbrados. Vem e descobre que só depois de se cegar com a Luz é que podemos ver de verdade.

Obrigada, Livro Falante, por ser fonte de Esperança!

Fiquem na paz… Outro dia tem mais! (:

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