O Bicho
Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.
O bicho, meu Deus, era um homem.
Este poema de Manoel Bandeira foi escrito em 1947, ano em que Al Capone famoso Gangster Norte americano morria e também tinha início o mais tenebroso inverno da Europa no século XX. Nos finais da Segunda Grande Guerra, na parte ainda controlada pela a Alemanha nazista em seu estertor, o sistema de abastecimento ainda funcionava razoavelmente, e salários e preços tabelados impediam o furor inflacionário. Mas quando os tiros por fim cessaram, seguido da desmobilização geral, instalou-se o caos. Nos dois anos seguintes à rendição nazista, a comida evaporou-se e o que circulava no mercado negro atingia preços inimagináveis. Em Berlim, a população, para sobreviver ao enregelamento, abateu todas as árvores da cidade. Os parques públicos, como o devastado Tiergarten, serviram para que neles proliferassem hortaliças. Onde outrora havia as elegantes tílias, agora vicejavam repolhos e nabos, plantações noite e dia policiadas pelos moradores para que não as roubassem. Lembro-me quando li o poema de bandeira (em meados de 1991) pela primeira vez na escola secundária que estudava sem saber nada sobre a realidade pela qual passava o mundo no ano em que nosso poeta escrevia sua crítica, mas fiz alusões a imagens que via perto de minha casa quando carrinheiros “fuçavam” os lixos de nossa rua em busca de alimento. Cheguei a pensar naquela época que em alguns anos isso não existiria mais afinal de contas estávamos progredindo como sociedade.
Desde minha infância moro em uma cidade que se gaba de suas obras sociais. Curitiba é vista em muitos lugares como cidade de primeiro mundo onde a pobreza mantém taxas mínimas e a desigualdade social é inexistente. Perdoem-me os que concordam com esta imagem de cidade, mas acho que a única coisa que nos iguala as cidades de primeiro mundo neste quesito é que nossos carrinheiros e pedintes têm olho azul e cabelo loiro. Quando ando pelas ruas hoje ainda vejo gente passando fome, pedindo esmola, sofrendo de miséria física e espiritual. Se o caro leitor (a) não endossa o que escrevo recomendo que converse com o @O_Cristiano para saber o que eles fazem no projeto Sopão nas sextas feiras.
Em documento expedido pela Organização das Nações Unidas em meados de 2009 davam conta que mais de um bilhão de pessoas no mundo passavam fome e de modo alarmante advertia que este século poderá muito bem ser conhecido como o “Século da Fome”. O que nós estamos fazendo para mudar este paradigma?
É triste pensar que como cristão me importo mais em pregar o evangelho do que estender a mão a meu próximo. Posso perfeitamente falar horas sobre Jesus Cristo para um mendigo sem, no entanto mostrar esse mesmo Jesus com minhas atitudes ao dar-lhe um simples prato de comida. Certa vez João Paulo II disse: “Contra a fome, mude de vida!”. Eu concordo com o pontífice católico nisso.
Só uma pergunta: Quanto tem sobrado de comida em seu prato?
Para aqueles que não sabem nem por onde começar, recomendo o Podcrent sobre o Projeto Sopão neste Blog.