Post do Leitor
Pergunto-me se essa gente que “odeia o pecado”, que “ri do diabo”, que “despreza o inferno”, que sempre está em um bom relacionamento com Deus e que crê na bíblia sem sequer um resquício de dúvida, se dizendo cristãs, tem noção do que estão crendo.
Porque se dizem que Deus, em sua Divina Pessoa, criou o universo, o Cosmos, todas as dimensões espirituais e todos os conceitos de bem, mal, pecado, santidade, todas as criaturas que habitam em zonas paralelas à realidade: anjos, demônios, operadores de milagres e manifestadores de pragas, se ela crê que a vida nasceu do solo e que foi soprada nas narinas sobre nada mais que bonecos de barro, se ela crê que tudo (sociedades, expressões artísticas, musicais e ritualísticas) apontam para a revelação do Pleno, de que o Maior Poder do Universo se tornou menos que um governante humano (e mesmo sendo infinitamente glorioso abandonou toda honra em favor de se vestir de humilhação, se submetendo ao mesmo inferno, diabo, mal e até ao pecado que nunca cometera para que, por Si mesmo pudesse triunfar sobre tudo, inclusive a Justiça Divina – a saber, a própria justiça), se ela crê que todo o universo palpável, com seus milhares de bilhões de corpos celestes e planetas alinhados de maneira harmônica, suspensos no céu por leis físicas complexas demais para serem explicadas em poucos minutos, se essa gente crê que esse mesmo Deus, num inverso de poder, mergulhou sua extensa e profunda sabedoria na carne, tecendo leis químico-biológicas igualmente complexas para funcionamento de ínfimas partículas para que a vida fosse ao menos sustentável, e que esse mesmo Deus fez, com as próprias mãos, o diabo, o inferno, o pecado, e todos os outros instrumentos de tormento e obras de terror e desespero que levam qualquer homem de bem a sofrer pesadelos e ansiar libertação da ideia constante da danação; qual o motivo de tratar com tanto desprezo o que também é transcendente?
Porque essa gente foge do conflito, se apoiando em um triunfalismo discreto e igualmente estúpido, como se fossem inatingíveis pelo que consideram mau, e em vez disso, assumindo a repetição de um molde, uma produção em massa? Encontram conforto na anestesia de disparar respostas prontas, replicando o que já se ouviu inúmeras vezes de tantos outros: uma zombaria da onipotência, onipresença e onisciência Divina. Criaturas ínfimas que deveriam ficar assombrados ao observar as variedades de manifestações do Criador, rindo daquilo que não se consegue compreender perfeitamente. Só há um comentário honesto de qualquer pessoa que se depara com tais agonias: “eu não sei o que dizer”. Mas se essa gente se acha forte demais para tratar a dor e o terror com o mínimo de empatia e assombro, estariam elas mesmas se colocando acima da obra de Deus? Isso é, no lugar dEle?
Talvez o diabo realmente exista. E o encontremos toda manhã no espelho, ao escovar os dentes.
Thiago Vieira não tem nenhuma posição dentro ou fora da igreja que seja digna de nota, e por isso, não sabe como se definir. Em compensação, é ótimo em passar a tarde toda jogando videogame e ficar ruminando tudo que leu e ouviu. Nas horas vagas caça moinhos de vento, exorciza demônios imaginários, cria receitas de remédios paliativos e canta músicas de ninar para seu monstro de estimação.
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